Como um tapete todo sujo # 4. Cerco

As pessoas não se conhecem quando pela primeira vez se conhecem. É uma verdade tão trivial, que as histórias que todos os dias contamos podem mentir sobre isso com o mesmo grau de trivialidade. Conheceram-se num congresso, diziam. Factual, mas não verdadeiro. Trocaram endereços electrónicos e houve várias mensagens, coisas profissionais, uma ou outra nota mais pessoal mas não íntima. Factual, mas também não verdadeiro. Porque a intimidade estava já no ritmo regular das mensagens, no leve sobressalto de ela não ter ainda chegado, na forma quase desprendida como iam mudando de assunto, rondando de longe, caçadores experientes mas dir-se-ia que saciados, presas indiferentes ao seu destino. O mundo entre ambos era sonâmbulo, o mundo de cada um deles acordava a horas certas e tinha tarefas que não admitiam adiamento. O mundo entre ambos existia apenas entre ambos, como terra estrangeira de que iam sabendo notícias sem possibilidade de confirmação.

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