Multiplex 2


- Menos comentários desta vez, não foi?
- Nenhuns, a bem dizer. Pela certa, foi confundido com filme de acção. O sinal evidente é que nas partes mais filosóficas crescia o barulho do trincar das pipocas.
- E o programa é nítido, como toda a gente disse.
- Violência gera mais violência, e mais violência pode levar à destruição total.
- Pois, o problema é que se isso é verdade para os indivíduos, não o é o para os estados.
- Não?..
- De um modo geral não, e para estes muito menos. Já vem no Rousseau.
- Ah, já me lembro. Qualquer coisa como: de homem para homem vivemos no estado civil e sujeitos às leis; os povos, esses, vivem em estado natural
- Exactamente. Os indivíduos renunciaram ao uso da violência e deram o monopólio dela ao estado, e é isso que garante a sociedade; os estados entre si, mais coisa menos coisa, vivem segundo a lei natural do mais forte.
- Se bem que esse mais coisa menos coisa não seja de deitar fora.
- Pois não, mas já não vem aqui ao caso.
- Talvez. Porque o caso queria ser o de um conflito entre países e acaba por ser, sem que o Spielberg o quisesse, o do velho conflito entre a consciência de um indivíduo e a real politik.
- Spielberg percebe de famílias, isso eu concedo, mas só percebe de famílias...
- ... e por isso pensa que a moral de um estado é a moral de uma família. Ora não é.
- O que não é mau nem bom, é simplesmente assim.
- E perdem sempre as famílias, mas isso também é simplesmente assim. Ou tristemente assim, mas é como é.
- No resto, é um filme de acção.
- Pois...
- E então, resultou?
- Na... Nem ponta de Groucho. Mas obrigado na mesma.
- Estás por tua conta. Vais ter de mudar de forma.
- Que gaita...
- E já agora, outra coisa...
- Sim?
- Não leves a mal, mas é melhor deixares a família de fora, percebes?
- Pois...
- Tás muito longe de ser o Larry David. Mas mesmo que fosses, eu não tenho seguramente qualquer vocação para ser mulher dele. Lamento.

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