Fora os gatos e a poesia # 1

Luís Maffei, Telefunken, Deriva, 2009

O mundo é um mundo de lugares. A lucidez — em si mesma uma forma de atenção e de acolhimento —, manda sempre perguntar de que lugar nos falam. Luís Maffei fala-nos de um lugar onde a tecnologia mais extrema não habita. Um lugar onde se dialoga com alguns clássicos e outros bem mais contemporâneos, mas sem que seja importante a autoridade, o grupo, a poética (oh, a poética...), a posteridade (oh, etc...) — em tudo isso, releva apenas o que mais nos assenta no mundo, sem a ele sucumbirmos. Um lugar que não é arcádia epigonal nem melancolia auto-contemplativa — sintoniza-se um telefunken para ouvir do mundo, com a vantagem de um telefunken ser suficientemente tecnológico para sabermos que ouvimos “demais”, e suficientemente obsoleto para sabermos que o simulacro já se mudou para outros artefactos. Um lugar onde há gatos, e os versos valem menos que os gatos, e a quietude felina admoesta a mão que escreve (melhor sentir a “prosa” de “pêlos sem metáfora ou mentira”). Um lugar onde há pessoas, crianças, amores, o deserto disso e a presença obscura disso também. Um lugar estranhamento parecido com o meu. Fora os gatos que não tenho, mas que poderia. E a poesia que nunca tive, nem poderia.

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