Susana, ou pensar

Tenho passado uma parte das aulas a fazer com as alunas a tábua dos argumentos do não e do sim para o próximo referendo. Trabalho minucioso, ponderado, e que permite perceber até que ponto cada um dos argumentos mais sólidos envolve toda uma postura sobre a existência, o político e o outro.
Desde a primeira hora, estabelecemos como metodologia que os comentários e as reflexões sobre cada um dos argumentos deveriam conter uma dose necessária de empiria: como é que isso se aplica na minha vida ou na vida que acontece à minha volta. E é espantoso o rol de histórias que nos mostram que se o neo-realismo morreu como literatura não foi porque a realidade “neo-realista” tenha desaparecido.
Nesta altura, já é claro que a maioria das alunas votará Sim, mas que os seus pais e outros adultos do lugar votarão tendencialmente Não.
E também já é claro que a Susana (nome fictício) mantém firme a sua intenção de votar Não, embora por razões bem diferentes das razões que tinha no início. A Susana disse que pela primeira vez tinha aprendido a pensar. A “pensar mesmo”, foi o que ela disse. E disse que o seu voto já não era épico, mas triste. Consciente, mas triste. E que contraía especiais responsabilidades para o depois do referendo, qualquer que fosse o resultado.
Eu votarei Sim, como já aqui disse, mas o meu grau de tristeza não é diferente do da Susana. Eu é que já quase me tinha esquecido disso, no afã dos argumentos mais empolados ou mais abstractamente filosóficos.

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