As fontes convocadas pela nota final revelam uma preocupação historiográfica que me parece fundamental (e não posso estar mais de acordo com o elogio ao livro organizado por Ana Barradas) e uma urgência ética que subscrevo. Contudo, uma coisa é a historiografia, a veracidade da memória (com o que ela comporta de factual e de contextualização não necessariamente desculpabilizante), outra coisa é o que fazermos agora com a história que nos legaram. Ou seja, se concordo que a nossa auto-consciência histórica tem claras dificuldades em falar do nosso período colonial enquanto colonial — lembro sempre a estupefacção dos meus alunos de cultura portuguesa quando chegávamos aos textos do livro de Ana Barradas, estupefacção que contudo sabia o suficiente do colonialismo britânico, por exemplo —, já vejo mal quais as vantagens de, aqui e agora, colocar em cena uma maldição que parece esgotar-se no próprio gesto de amaldiçoar. E não o digo só por nós, portugueses — não enjeito o pecado original que possa existir em pertencer-se a um determinado povo ou nação —, mas também por esse homem negro que amaldiçoa, assim duplamente encerrado na sua escravatura e na sem saída de uma maldição que, por mais justificada que seja, apenas perpetua o ciclo da destruição.
Um punhado de terra é um texto ímpar na forma como mostra uma situação que foi destruída, mas termina numa invocação apocalíptica que se quer libelo acusatório. Ora, jamais voltaremos aos tempos anteriores a essa destruição — e isso o livro sabe-o bem. Mas, também, jamais esse homem negro e esse homem branco poderão deixar de existir um para o outro. Nessa perspectiva, a tarefa pós-colonial por excelência não será inventar um presente para lá da justiça de amaldiçoar e da justa culpa de ser amaldiçoado?
Esta terra estrangeira # 2
Luís Mourão
2.6.09 |
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