paisagem, areia 9 [louvor e retroversão do polaco de álvaro de campos ou insulto aos leitores]
Limitados.
Preferem a quinta-feira ao infinito.
Primitivos.
Wislawa Szymborska, Paisagem com grão de areia
Psicopatologia da vida quotidiana
Os sixties elevados ao estado de substantivo
“Num livro, como em qualquer coisa, há linhas de articulação ou de segmentaridade, estratos, territorialidades; mas também linhas de fuga, movimentos de desterritorialização e de desestratificação. As velocidades comparadas de escoamento segundo essas linhas arrastam fenómenos de atraso relativo, de viscosidade, ou, pelo contrário, de precipitação e de ruptura. Tudo isso, as linhas e as velocidades mensuráveis, constitui um agenciamento. Um livro é um desses agenciamentos, logo, inatribuível. É uma multiplicidade – mas não se sabe ainda o que o múltiplo implica quando deixa de ser atribuído, isto é, quando é elevado ao estado de substantivo.”
[Deleuze & Guattari, Rizoma, trad. de Rafael Godinho, Assírio & Alvim, 2006, p. 8]
Toca-me particularmente o “não se sabe ainda”. Isto significa que nunca se saberá, e que o movimento através do qual nunca saberemos é a nossa própria existência. Consegue-se viver aqui? Elevado ao estado de substantivo? Sim, é uma ascese, por mais que muitos estejam dispostos a adjectivá-lo como rebaixamento. Mas justamente, não é disso que se trata. Nem de adjectivar nem de atribuir para cá ou para além dos adjectivos. Trata-se de continuar a não saber ainda todas as implicações. E de chamar a todas as possibilidades de implicação vida.
paisagem, areia 8 [tempo & suplemento]
Frases iniciais exemplares, de autores justamente esquecidos... #2
Mas estão-me aqui a dizer que já ultrapassei o limite de caracteres suportáveis para matérias altamente teóricas, de modo que digo apenas mais duas coisitas: a) não é justo que não acrescente o meu contributo à sua lista, esforcei-me tanto e tudo (snif, snif...); b) Jerónimo Bemposto existiu, e dele darei mais notícias em breve — o facto de não constar na Biblioteca Nacional lembra aquela história dos investigadores europeus que vinham por aí abaixo para consultar os inéditos de Pessoa, deparavam com uma gavetinha de registos e ficavam todos contentes, e quando já estavam de partida alguém os avisava caridosamente que havia imenso material não catalogado, e, mais que não catalogado, não localizado. A gente pensa que aquilo é a Arca de Noé, e a modos que sim, mas é muito desorganizada, e com o andar dos tempos deus tem-se descuidado o seu tanto com edições de autor e gráficas de vão de escada.
Ler
Absolutamente de acordo. Como aliás com o resto do post, nas suas intenções e nas suas ressalvas. Gostava apenas de introduzir uma nuance, ou melhor dito, gostava de explorar as consequências da tensão que se abre entre a leitura como relação impessoal e o facto de não sermos capazes (eu até diria, de não devermos ser capazes) de ignorar o criador da obra. De uma forma simples mas que pode ter vários caminhos, não ignorar o criador da obra só nos interessa aqui se se constituir como uma forma de ler a obra, ou de interpretá-la. Caso comum: a entrevista com um autor acerca da sua obra, em que ele diz como quer ser lido ou o que quis fazer. Não se deve descartar sem mais esta interpretação. Simplesmente, deve-se testá-la como se testa qualquer interpretação: lendo por nossa própria conta e risco. Quase sempre esse teste nos dá uma imagem de obra diferente daquela que o autor tem, mas dá-nos também, interpretando a interpretação do autor, uma certa imagem de época, com o lugar mediático que nela ocupa o autor e a sua aura no star system, etc. Exemplo banal: nas entrevistas, Saramago é assertivo e toma o lugar do sage. É o que o star system pede que um escritor faça. Ao actor ou ao músico, basta-lhe aparecer; e para um estatuto mais intelectual, defender uma causa. O escritor tem de dizer qualquer coisa, porque a imagem de literatura e, por extensão, de intelectual, é ainda a do século XIX, em que se supunha que o autor era aquele que tinha qualquer coisa de diferente para dizer, e que era capaz de o dizer, fosse na obra, fosse no panfleto, fosse na sua intervenção pública. Voltando a Saramago: uma das linhas de leitura mais comuns da sua obra apontam um narrador não assertivo, que não toma o lugar do sage mas da ironia que instabiliza o saber. Esta tensão entre a leitura da obra e a presença paralela do criador da obra como seu intérprete pode ser muito elucidativa de certos aspectos da contemporaneidade: por exemplo (e era um exemplo que nos poderia levar muito longe), dificilmente uma obra, hoje, consegue ser, por si só, escandalosa; mas a um autor, é extremamente fácil produzir umas quantas afirmações bombásticas. A elasticidade de sentido que estamos dispostos a conceder ao mundo do pensamento parece esfumar-se num ápice quando “regressamos” ao mundo real, em que o dizer público do escritor entra no mesmo circuito que o dizer público dos políticos e das gentes anónimas; o mundo da obra é o de pensar possibilidades, o mundo real parece ser o de confrontar individualidades. Em qualquer caso, a tensão e a sua produtividade vem sempre de nunca abandonarmos a tentativa realmente impossível da leitura como relação impessoal com uma obra. Quer dizer, é só vista desse lado que a impossibilidade de ignorar o criador da obra se torna um facto relevante.
Hezbollah
Quanto ao Hezbollah, parece-me razoável dizer-se que ele é fashionable para alguns desencantados da esquerda europeia e, mais difusamente, para um certo voyeurismo mediático que gosta de assistir ao frisson da guerra no conforto das suas poltronas. Tudo isto seria de pouca importância não fosse o caso de este modo-de-estar constituir parte importante do burburinho que os políticos eleitos ouvem nos barómetros da sua popularidade e os leva às hesitações e recuos a que temos assistido relativamente ao papel da força de interposição. Mas esta parte do problema é exclusivamente nosso. Também me parece bastante claro que os métodos do Hezbollah, enquanto força militar, são terroristas.
Mas, a partir daqui, só tenho dúvidas e ignorância. O enraizamento do Hezbollah nas populações é apenas estratégia de perfeita camuflagem ou, mesmo sem deixar de ser isso, é a única forma de civilização que essas populações têm? O Hezbollah é o Estado dessas populações? São suas as únicas escolas e hospitais a que essas populações têm acesso? Saber isto parece-me decisivo para encontrar a forma adequada de lidar com essas populações. Mas também se pode pôr a pergunta desta maneira: o que é o Estado do Líbano para essas populações? Onde é que existe como forma de construir um tecido social e de o regular juridicamente? Isso, eu gostava de saber. Porque me parece, daqui de muito longe, que a realidade do Hezbollah é bem mais complexa do que vista pelos olhos dos que a julgam quer fashionable quer demoníaca.
Frases iniciais exemplares, de autores justamente esquecidos...
Psicopatologia da vida quotidiana
Pequenos prazeres críticos
Há uns anos atrás eu não acreditaria que alguma editora “profissional” se atrevesse a traduzir Zizek (editora profissional: aquela que não é constituída por meia dúzia de maduros que desembolsam para publicar os livros de que gostam em vez de investir na bolsa ou em PPR).
Obviamente, estava enganado. Com o atraso do costume, mas com a persistência que indica, apesar de tudo, algum enraizamento do pensamento crítico, alguns nomes fundamentais do pensamento contemporâneo vão sendo traduzidos (Sloterdijk, Stiegler, Said, Badiou). Não pertencem à equipa galáctica dos Derrida-Rorty-Wittgenstein-Deleuze, mas são do mais estimulante do pensamento de hoje. Que um mercado pequeno, tradicionalmente renitente à filosofia e ao ensaísmo em geral, consiga espaço para estes autores, é uma boa notícia. Ok, não é a obra completa nem sequer, mais modestamente, o best of. Portugal não é a Espanha, e há que saber viver com isso. Mas já é o suficiente para produzir boas consequências: por exemplo, aquela sensação toda ela europeia de ler Zizek inteligentemente citado em português. Pequenos prazeres.
Psicopatologia da vida quotidiana
Descruzando polémicas
Tinha percebido que estava a comparar as duas intervenções públicas. O meu ponto não era discutir os méritos das intervenções públicas de Grass — não me pronunciei nem me pronunciarei sobre isso, apenas digo que, neste ou em qualquer outro caso, um juízo sobre a ética pessoal de um indivíduo não se pode repercutir como juízo sobre as opiniões que esse indivíduo expande. O meu ponto, que já vinha de posts anteriores, era o de afirmar que Grass, enquanto consciência da má-consciência alemã, estava indubitável e complexamente nos romances, e não nas suas intervenções públicas. Ora, ainda que possa conceder que filosofia e romance não são comparáveis (mas acho que ambos concordaríamos que a questão se poderia complicar bastante), o que me interessava era saber se o juízo de valor que fazia sobre as intervenções públicas de Grass era extensível aos seus romances (e por aqui se vê que quem se explicou mal fui eu, porque se esta era de facto a minha pergunta, bastava fazê-la nestes exactos termos). Pela sua resposta, percebo que não. Mas já agora também adiantarei que desconfio bastante dessa consensualidade de que Grass continua a ser um grande escritor. Isto não o envolve a si, mas àqueles que acham que Grass é um grande escritor mas nunca devia ter aberto a boca publicamente por causa do segredo agora revelado. Porque é que dirão que Grass é um grande escritor? Metáforas, ritmo de escrita, qualquer coisa assim supostamente da forma por oposição a um não menos suposto conteúdo? É que se é por os seus romances serem interpretáveis como a consciência aguda da má-consciência alemã, não percebo de todo o alarido: todo o episódio lá encaixa na perfeição. A arte imita a vida que por sua vez imita a arte. E desta maneira ou daquela (há diferenças, claro, e não deixam de ter a sua importância), nenhum romancista, como nenhum leitor de romances, estará à altura daquilo que o romance descobre como exigência ética de um tempo e de uma vida.
Grass III
PS1: Meu caro Rui Bebiano, em boa verdade não há sequer razão para polémica. Até estou completamente de acordo com isto.
PS2: Meu caro Carlos Leone: se ao lado da Arendt de Eichmann em Jerusalém colocar o Grass de O tambor, acha que poderá manter a distinção entre um Grass “vazio e retórico” e uma Arendt “analítica e séria”?
Grass II
Grass ou a higiene equívoca
O que há de pernicioso na notoriedade é que ela cria um ciclo vicioso que tende a iludir e auto-iludir todos os intervenientes. Um escritor considerado notável poderá ter tendência a considerar igualmente notáveis as suas opiniões políticas, as quais tem como cidadão, ainda que pense proferi-las como escritor. Mas a turba gosta de entrar nesse jogo, gosta de ouvir a partir de uma instância intelectual ou moral aparentemente superior, para se desresponsabilizar da sua tarefa crítica e ter logo ali à mão algumas verdades pronto-a-vestir. O que empolga o escritor, que muito humanamente também se empola, e o mesmo com a turba, e assim de vento em popa até um desmentido qualquer. E o sururu consequente. Que por acaso é um holofote imenso sobre a próxima publicação da biografia de Grass. Eu disse por acaso?
PS1: Meu caro Rui Bebiano, gostava de o perceber melhor nisto. Em que é que o seu juízo sobre a conduta do cidadão Grass (juízo que até poderia partilhar, mas não é esse o ponto) o leva a dizer que jamais voltará a ler um livro do escritor Grass anterior a esta confissão tardia? Hipótese: não será esta recusa de ler ou de re-ler a pior forma de leitura? Noutra vertente: não virá esta declaração dar uma espessura maior à dimensão crítica do romancista Grass, por exemplo?
PS2: E meu caro Eduardo, se o romancista Grass sair engrandecido deste episódio, é porque o seu romance terá triunfado de vez sobre os seus ensaios, mais ou menos panfletários. E só esse triunfo revelará verdadeiramente a futilidade das agendas de patrulha, porque é a sua crítica profunda. O resto, parece-me a mim, é futilidade por futilidade: a patrulha, claro, mas também o ar de escândalo que rodeia todo este affaire.
Multiplex 18
- É mesmo assim? Não é, pois não?
- Claro que não. O único problema é que não pode ser de outra maneira.
- Então acaba por ser assim?
- É a única maneira de se poder continuar a viver. Bastante irónico, hem? Mas pode-se sempre tentar ler o valor facial da metáfora.
- É conseguidamente óbvia, Luís. O combate que se via no exterior, e de que o menino se protegia por detrás da mãe, é agora interior à família, por causa do divórcio. O adolescente tem de saber encará-lo, aceitá-lo talvez como tão permanente como ele parecia ser no museu, e aprender a não ter de escolher entre a lula e a baleia.
- Não me parece mal, Leitora.
- Desse ponto de vista, do não parecer mal, também a mim não me parece mal. Mas assusta-me que uma vida se possa assim dizer por uma metáfora tão justa.
- Assusta-te?
- A redução.
- Ah, isso. É uma forma de falar, de poder falar para avançar.
- Mas a minha questão é se não há outras maneiras.
- Há sempre. Provavelmente vão dar ao mesmo sítio por outros caminhos. E todo o filme é um capítulo, não mais. Outras metáforas virão. O que não acrescenta muito ao teu problema.
- Pois não. Estamos sempre perto da nota de rodapé, ou da nota dentro da nota, ou até do completo anonimato.
- Assusta-te?
- Um pouco.
- Melhora com a idade.
- Sério?
- Palavra de escuteiro.
- Nunca foste escuteiro.
- Aí tens a tua prova, precisamente.
O primeiro round
paisagem,areia 7 [espera-se que um pouco antes do cessar-fogo]
Naturalmente, sonhei com Bin
Simplesmente metafísico, o sonho
Nunca me tinha rido tanto num sonho. O Ricardo orava a sua fé sportinguista, e o blog publicava-lhe loas de hooligan portista. Lá do seu cantinho, o Francisco ironizava em azul-e-branco, e o blog publicava-lhe hinos ao glorioso. Coisa de boulevard, mas com os rostos perplexos em alta definição. Estranhamente, Freud apareceu no fim, estendido no divâ: “Menino, o tema aqui é Deus. Porta-te mal.”
Sonhar? Deus me livre!©
- Tu tens saudade de sonhar, Groucho?
- E tu, Groucho†?
- Eu não.
- Eu também não.
- Mas sonhavas, Groucho?
- E tu, Groucho†?
- Eu não.
- Eu também não.
- Curioso, parecemos muito iguais.
- Mas não somos, pois não?
- Deixemos isso. Tu não achas que o Luís está a sonhar demais?
- Agora que o dizes... Porque será?
- Agora que perguntas, acho que é porque não tem onde cair morto.
Um sonho magrinho
A saga onírica continua: Duas Torres
Sobe-se às Duas Torres por estrada serpenteando entre árvores até à casa térrea com vista ampla sobre a quinta. Sala com decoração minimal, serviço presto. Primeiro, umas boas-vindas doutrinais. Somos gentilmente informados que tudo o que é aqui confeccionado é de produção biológica, que o fogão é a lenha e que até as toalhas, guardanapos e fardas do pessoal são de tecido biológico, que nos asseguram ser excelente para a respiração da pele humana, ainda que ao toque se tenham revelado diáfanos, como o seu quê de virtual, o que desgostou, devo confessar, o meu lado conservador: nada como a rugosidade do linho ou do algodão de gramagem consistente.
Duas Torres não é uma casa da linha dura vegetariana, no que diz respeito a uma certa permissividade na presença e até na mistura de ingredientes. A sua preocupação maior é estar em sintonia com os ritmos naturais da terra, isto é, do lugar. Asseguram-nos que isso é uma outra forma de cosmopolitismo, menos preocupada em alardear as benesses da globalização, que não negam, do que em usufruir os sabores singulares de cada dádiva do tugúrio. A Carta é por isso sazonal, de acordo com a produção da quinta e das suas congéneres, o que se compreende e até se pode aceitar. Aceita-se menos o seu carácter tão restritivo que se torna perigosamente autoritário: impossibilidade de escolha pela imposição do prato único. À minha manifestação silenciosa de desagrado respondeu presto um empregado talvez versado em teoria da literatura, argumentando que certas poéticas alimentares buscam tão subtis pontos de equilíbrio ou de passagem, que embora parecendo que tal se possa obter de múltiplas maneiras, há que buscar a única que a possa assegurar em toda a sua discreta profundidade. Sem mostrar convencimento, mas igualmente sem vontade para qualquer disputa estéril que não mais faria do que acicatar a fome, passei à consulta da Carta. Ajuíze o leitor esta composição. Entradas de queijo fresco de cabra, quadrados de pão de mistura, e salada singela: alface, tomate e cebolinho. No capítulo das sopas, apenas de ervilhas. Prato único: beringela assada no forno com recheio de lentilhas e cortes de feijão verde, seitan salteado com brócolos em óleo de girassol, e arroz integral cozido a vapor e passado pelo forno. Sobremesas, apenas duas: maçã cozida com passas ou sonho de pêra e ébano. Para beber, vinho tinto biológico da quinta, água do veio da mina ou chá de cidreira.
Se para tanto é preciso uma Carta, eis o que nem vale discretear. Ao menos estava em português escorreito e papel visivelmente reciclado.
Ao paladar, o queijo fresco de cabra revelou-se somítico de sal mas encorpado q.b., o pão de mistura regular, e a salada deveras singela e rural, com destaque para o cebolinho, quase doce como é desiderato de todo o bom selvagem. A sopa de ervilhas, ligeira e perfumada, mereceria um adjectivo eciano a condizer. A beringela assada não suportou o recheio das lentilhas, empapando-se ambas no feijão verde que, contumaz, venceu uma contenda que não devia. O seitan mostrou um carácter anémico, apesar dos brócolos esforçados e do sainete do girassol. Já o arroz foi uma surpresa agradável, beneficiando de um forno em ponto certo para lhe devolver a sua natureza de cereal estaladiço e brincalhão. A maçã cozida com passas foi comovente de naturalidade e graça, e deixou um travo floral todo ele campestre e aberto. O enigmático sonho de pêra e ébano era afinal pêra cozida com canela e melaço de cana, talvez mais interessante se não se tivesse anunciado com tanta pompa e circunstância. Provou-se o vinho tinto biológico da quinta, que definitivamente precisava de outras iguarias na mesa para que dele se pudesse aquilatar, bebeu-se a água cristalina, e tudo se aconchegou com o chá de cidreira.
Foi já descendo para a civilização que me ocorreu que não sei de onde vem o nome que a casa ostenta. Torres não vi nenhuma, nem vestígios de tal. Mas talvez não valha a pena voltar atrás para perguntar...
Pronto, agora só blogo em sonhos e para outros
Foto da Charlotte em oração matinal (percebe-se pela pergunta, ao fim do dia as questões são bem diferentes), antes de cantar Bye Bye Blackbird.
Para o que me havia de dar, sonhei com dois posts para o irmaolucia: eis o primeiro...
Sandro tem dois amores: o homem dos almoços beatos grátis, Torquemada César das Neves, e o homem que almoça sempre nos clubes, Conselheiro Espada. Pelo seu lado, Carina achava melhor que a pilinha dos homens viesse de origem com tampinha de enroscar.
... e o segundo:
A Leitora, no seu infinito particular (XXVI)
- Que descanso estranho o teu, Luís.
- Ora...
- Parecia a reactualização do mito barhesiano do intelectual em férias. Muito novo século, claro. Menos livros, menos manuscritos para acabar, mas demasiados posts e muita filosofia de impoder, quer dizer, muita filosofice inconsequente, como tu dirias se tivesse sido eu a autora de tais desmandos...
- Pois...
- Mas as tuas audiências desceram abaixo de zero, tens de ter cuidado. E nem um comentário ao que anda pela blogosfera, nem um mísero link, nada de nada.
- Falta de condições durante o descanso, falta de tempo agora.
- Mas um blogger que se preze...
- Não multipliquemos os deveres a não ser que seja impositivo.
- Certo. Mas ao menos deixa-me ajudar-te a acertar o passo.
- Vais finalmente escrever aqui, Leitora?
- Estava apenas a pensar fazer-te uma entrevista. Coisa rápida. Primeiro. Já foste acusado de ser anti-semita?
- Ainda bem que me fazes essa pergunta porque...
- Tens de ser mais rápido na resposta. Achas que a Síria vai entrar no conflito ou está a fazer bluff a não ser que se queira arriscar a apanhar com o nuclear sino-americano?
- Sabes que o Freud dizia...
- Nada de divagações. No caso Gisberta, terias pesado mais a necessidade de não deixar um crime impune ou a possibilidade de recuperar menores?
- Bom, como sabes, o social e a justiça são vectores...
- Sê mais directo, estou quase a acabar. Não achas refrescante, sinal de grande mudança, que ao menos uma vez o país tenha razão numa contenda com um dos seus grandes símbolos, como a Maria João Pires?
- O Saramago terá sido o último a exilar-se com legitimidade, é isso que queres dizer?
- Vês como consegues responder direito quando te esforças e vais directo ao assunto?
Guarda-nocturno do mar # 30
- E agora?
- Continuamos.
- Preciso que me digas que tudo vai correr bem.
- Vai tudo correr bem, sossega.
- Como sabes?
- Ninguém sabe. Mas diz-se. Faz-se acontecer.
- E se?
- Até ao fim. Não é uma promessa, é como as coisas são. As nossas pequenas coisas.
- Gosto de te ouvir dizer as nossas pequenas coisas.
Guarda-nocturno do mar # 28
Guarda-nocturno do mar # 27
Guarda-nocturno do mar # 25
Guarda-nocturno do mar # 23
“este não é um dizer de boca; este é um dizer opaco; / este não é um dizer facial mas abstracto” [Maria Andresen, Livro das passagens, p. 87]:
- Azul.
- Verde.
- Qualquer coisa entre ambos.
- Não seria melhor se fosse qualquer coisa depois de ambos?
- Talvez. Mas prefiro o que está antes, isto a que para cá das cores chamamos.
- Não digas.
- Não ia dizer.