Retomo para finalizar. Há também aquele lado do comum que temos de resgatar ao quotidiano gasto da comunidade para que nos possa ainda re-constituir enquanto comuns. À sua maneira, uma forma não de devolver a aura para sempre perdida — e que provavelmente nunca o foi enquanto aura originária —, mas de encontrar um caminho para ver/ouvir o momento do único, isso que é o mais frágil e o mais perigosamente próximo do insignificante.
Exemplifico agora com Keith Jarrett, Radiance, o seu disco a solo de 2005. Ouça-se a faixa seis do segundo disco. Percurso caracteristicamente jarrettiano: início atonal, pesquisando não se sabe bem onde, caminho que se vai traçando, uma melodia que se ergue do nada, imprecisa, mas traçando o seu caminho, muita história da música (como não ouvir claramente Bach? e um romantismo dilacerante ouvido através de Bach? e...) e entre os 4’ 00’’ e os 4’40’’ essa «coisa» que nas mãos de outros seria toda a música até se gastar em melaço e que aqui é o único irrepetível, fulgurante, que deixa esse rasto de paz e volutas até ao fim da faixa. Tudo está em como se chega lá e em como nos afastamos de lá. Tudo está em como sabemos resistir à tentação da fusão com o sublime. Porque nunca se vive no coração das coisas, vísceras abertas. Mas se não for esse coração a transportar-nos, o que será?
Quem é o autor? ou Arte & Contexto # 14
Luís Mourão
18.7.07 |
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