— Faulques, o ex-fotógrafo, o pintor de batalhas, confessa que depois de assistir a uma cena de horror o que lhe apetece é fumar um cigarro, beber um copo, fazer amor... É algo que o faz voltar à vida, regressar à normalidade? Algo que Pérez-Reverte também faria?
— São consolos. É como uma aspirina, um analgésico. (Hesita). Não se pode mudar a dor, e drogar-se para a evitar é perigoso, porque a droga tira a consciência. O analgésico não. O analgésico permite saber o que é a dor, suportá-la e seguir caminhando. Se estiver drogado piso a mina. O cigarro, o copo, o que seja... dou tanta importância às coisas que nos fazem suportar a dor: a cultura, o livro. Quando estava em Sarajevo, depois de dias duros com 20 ou 30 mortos no telejornal, com sangue nas unhas, chegava ao quarto, acendia uma vela e sentava-me a ler no chão para que os franco-atiradores não me vissem pela janela. Ficava num canto, abria um livro e lia Stendhal, A Cartuxa de Parma, A Montanha Mágica, de Thomas Mann, O Leoprado, de Lampedusa, e o sangue das unhas tornava-se suportável. A palavra é tornar essa realidade suportável, chegar ao final e continuar suportando. O mundo não resiste, não há lucidez e a falta de lucidez torna as coisas insuportáveis... Se é Deus que está a organizar isto quero apanhá-lo e dizer “adonde está Dios que me voy a cagar en su puta madre!”. Quero organizar o caos, entender a sua simetria. Essa é a questão. É muito difícil de suportar. Por isso faz falta o cigarro, o amigo, o amor, o sexo, a cultura, o quadro... Florença.
Entrevista de Artur Pérez-Reverte ao Diário de Notícias, 13 de Abril de 2007
Escrever contra # 4 [de certa forma]
Luís Mourão
13.4.07 |
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