A Leitora, no seu infinito particular (LVI)
Luís Mourão
13.4.07 |
0 Comments
- A tua questão não é o sangue nas unhas, pois não?
- É e não é. Não tenho essa experiência, mas o importante na experiência literal do sangue nas unhas não é o sangue nas unhas, mas o que isso significa. A vergonha de existirmos, de alguma forma. O morrermos um pouco, e ser tentador querer morrer tudo. Ou querermos matar, que é a mesma coisa, ainda que se pense que não. Mas espera, é isto e também não é isto.
- Eu espero.
- Há um tempo em que tudo o que vivemos é visto a partir daquilo que poderemos construir com isso que estamos a viver. Fazer planos, ter um projecto de vida, como se dizia.
- E?
- As coisas falham. É a coisa mais natural do mundo, mas é sempre inesperado. Terrível. Insuportável, de alguma forma. Sempre insuportável. Por isso as coisas mudam. Não é que deixes de fazer planos. Há uma parte da tua vida em que há sempre planos a fazer. Mas há também uma parte da tua vida em que agora vais apenas viver cada coisa por si própria. Acendes a vela para ler o livro, e isso não é parte do plano nacional de leitura. Estás só a ler o livro. Nem sabes se acabarás. Nem isso importa. Cada minuto de leitura é teu. Nada nem ninguém te roubará jamais a felicidade desse minuto. Não a somas para o futuro, não a conjugas no passado.
- Estás-me a falar da nossa diferença de idades?
- Sim e não, Leitora.
- Preferia quando tu citavas Celan: não separes o sim e o não.
|
This entry was posted on 13.4.07
You can follow any responses to this entry through
the RSS 2.0 feed.
You can leave a response,
or trackback from your own site.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
0 comentários:
Enviar um comentário