A comunidade política aborrece a franqueza. Como lhe falta imaginação para o pensamento verdadeiro, põe toda a sua esperança na intriga e no puzzle palaciano, essa espécie de telenovela do espaço público. Ora a franqueza cerceia toda a efabulação, porque coloca a comunidade perante o facto consumado e escandaloso de alguém pensar exactamente o que diz. A franqueza não se presta a interpretações, apenas a leitura, embora esta distinção seja em regra impossível de estabelecer e não seja prudente defendê-la nos fóruns da especialidade. Sem a efabulação, uma comunidade não pode treinar o sentido do seu futuro. A franqueza quer-se apenas na vida privada, ainda que dentro de limites práticos que não ponham em causa a reserva que cada um deve a si mesmo. Para estes efeitos, o amor está para os sujeitos como a política para a comunidade, ambos foram inventados para dar forma e contenção ao desejo e à violência. O respeito que se tem por um adversário, que é a consideração exacta da sua inteligência e da sua capacidade de fazer o mal, convém que seja ainda maior dentro do círculo do amor, porque o estado de indefesa é aí de regra. Não é por acaso que quando o amor se faz notar na cena política todas as histórias terminam em escândalo e sangue. Na verdade a política liberta o inconsciente violento e ancestral do amor, quando ele era a forma política de administrar uma comunidade reduzida ao mínimo, como no caso de Adão e Eva, que geraram filhos na discórdia e no confronto: onde poderiam Abel e Caim ter aprendido a inveja e a rivalidade, se não tinham outros modelos a não ser os pais?
esboço # 10 [o respeito por um adversário]
Luís Mourão
18.8.08 |
0 Comments
|
This entry was posted on 18.8.08
You can follow any responses to this entry through
the RSS 2.0 feed.
You can leave a response,
or trackback from your own site.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
0 comentários:
Enviar um comentário