O Senhor Walser # 7. Auto-organização. Obstáculo. Efeito perverso.
Luís Mourão
10.1.07 |
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Walser não se preocupa muito quando, menos de duas horas depois de estar na sua casa nova, aparece o canalizador por causa da torneira da casa de banho. Bem pelo contrário: “Retirada já do seu sítio e colocada no chão, a torneira parecia estar num momento de repouso, e Walser sentia o ímpeto de agradecer já àquele homem, mesmo antes de ele terminar o seu trabalho. A sensação era de que algo que fora necessário fazer estava a ser feito, tal o modo tranquilo e conclusivo com que a torneira e o chão se haviam, utilize-se esse termo, misturado.” (p. 22). Em suma, Walser confia na capacidade auto-organizativa da racionalidade absoluta. Aplicada a casas, sobretudo àquelas, não o esqueçamos, que são uma conquista da racionalidade absoluta, a capacidade auto-organizativa deveria manifestar-se também através de uma permanente função auto-reparadora: alguém mandou o canalizador, alguém sabe e vela, e não foi certamente o mordomo, porque aqui não há mordomo.
O problema começa — sim, há um problema... —, o problema começa quando esta capacidade auto-reparadora se torna um “obstáculo concreto” (p. 23) à plena fruição da casa. Efeito perverso da racionalidade absoluta, sem dúvida, esta minúcia da perfeição, quando a olho humano tudo parece estar bem. Walser não o diz, mas é bem provável que, nesse particular momento em que sente a presença do canalizador como um “obstáculo concreto”, Walser tenha pensado que a minúcia da perfeição poderia ser um processo infinito. Como se a racionalidade absoluta fosse uma situação tão frágil que tivesse constantemente de estar a ser reposta. E, portanto, nunca fosse uma racionalidade absoluta realmente fruível enquanto tal. Walser, digamos assim, como concreto suspeitador das capacidades do Espírito Absoluto, perdão, da racionalidade absoluta.
Mas pouco importa que Walser o tenha pensado ou não. Não é por aí que vai a história. Não pelos efeitos perversos do quase que faltará a toda a completude para ser verdadeiramente uma completude, mas pelos efeitos perversos, e em rigor lógicos, que advêm do facto de a racionalidade absoluta não permitir o Acto.
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This entry was posted on 10.1.07
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