Os mandarins também se abatem? Oh, sem dúvida...


O texto de Eduardo Pitta é tão sóbrio e justo na sua denúncia, quanto participante no “não havia necessidade” do assassinato. O que diz é inteiramente correcto: alguém teve poder (não sei se tanto como Eduardo Pitta dá a entender, mas tomo a sua informação como a de alguém que sabe do que fala), alguém que raramente foi desafiado nesse poder, alguém que só agora, “que o fazem mais doente do que está”, é criticado pelas mesmas coisas que já mereceriam crítica há vinte anos atrás (não vou discutir se já há vinte anos, porque o meu ponto é outro). “Portugal não muda. É pena.”, conclui Eduardo Pitta.
Ora, onde Portugal também não muda, e é pena — sobretudo vindo da frontalidade e sobriedade de Eduardo Pitta —, é naquilo que o seu texto omite. E omite o quê, o texto de Eduardo Pitta? Os nomes próprios. O que deveria ser o justo combate na arena do espaço público, torna-se piscadela de olho para iniciados: não o espaço público, mas a apropriação desse espaço para conversa privada.
Penso que não estarei errado ao presumir que o texto se refere a Eduardo Prado Coelho. Agora Eduardo Pitta dir-me-á se havia necessidade de ter usado o “ele” em vez do nome próprio. Por alguma razão — mas podem ser razões demasiado privadas, que sei eu? —, lembro-me de Eduardo Prado Coelho ter escrito não sei aonde que a maior violência que sofreu na sua integridade foi quando dois médicos, falando entre si, se lhe referiram como “ele”. Coisa que vinda dos médicos, naquele contexto, era perfeitamente aceitável, mas que foi sentida como sinal evidente de que estava em perigo.
Não sei qual é a “piadola soez” a que Eduardo Pitta se refere, nem quem o seu autor. Se calhar também não ganharei nada com isso, a não ser acrescento de alguma tristeza e de alguma justa indignação. Mas preferia saber. Porque às vezes começo a pensar que não é bem Portugal que não muda, mas apenas algumas pessoas. E não queria que essas pessoas não se ouvissem chamadas pelo nome próprio à responsabilidade que lhes cabe.
É pouca coisa como medida de transformação do espaço público? Claro. Mas porque não começar por aí?

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