O que me fascina nesta fotografia não é o seu lado aparentemente cómico. Afinal, para quem desagua de repente em África ou na China, a primeira impressão é a de que muitos rostos são fotocópias uns dos outros, essa incomodidade de sabermos em sede teórica que eles são diferentes mas não termos ainda o olhar ajustado para percebermos essas diferenças dentro de uma matriz que não é a nossa. O que me fascina nesta fotografia é imaginar a cena doméstica das memórias de viagem: a fotografia mostrada aos familiares, e cada um reconhecer naturalmente a identidade das mulheres, como se o véu fosse o rosto. Não, digo mal. Não é como se o véu fosse o rosto, que obviamente não é, é a oclusão do rosto. É como se o rosto estivesse deslocado do seu lugar, como se o rosto fosse o corpo no seu conjunto: o seu movimento, o seu ar, a sua maneira de ser. Um rosto nu talvez concentre toda a significação do corpo; um rosto tapado talvez disperse essa significação por cada uma das partes do corpo. Mas a significação não se perde. E por isso é reconhecível, identificável.
A Leitora, no seu infinito particular (XXXI)
Luís Mourão
10.12.06 |
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