Lembras-te do absurdo? E se procurasses no passado?
É sempre um bom lugar para procurar essas coisas, concordo. Mas já passei a fase.
Eu dizia procurar abstractamente.
A puxar à metafísica?
É mais à metapsicologia, penso eu. Mas tenta assim:
A Nossa Vez
É o frio que nos tolhe ao domingo
no Inverno, quando mais rareia
a esperança. São certas fixações
da consciência, coisas que andam
pela casa à procura de um lugar
e entram clandestinas no poema.
São os envelopes da companhia
da água, a faca suja de manteiga
na toalha, esse trilho que deixamos
atrás de nós e se decifra sem esforço
nem proveito. É a espera
e a demora. São as ruas sossegadas
à hora do telejornal e os talheres
da vizinhança a retinir. É a deriva
nocturna da memória: é o medo
de termos perdido sem querer
a nossa vez.
Religiosamente.
E tem ajudado?
Amanhã de manhã já entro oficiosamente na ressaca.
Ainda bem, ainda bem.
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