Cesariny # 2


A um rato morto encontrado num parque 



Este findou aqui sua vasta carreira 

de rato vivo e escuro ante as constelações 

a sua pequena medida não humilha 

senão aqueles que tudo querem imenso 

e só sabem pensar em termos de homem ou árvore 

pois decerto este rato destinou como soube (e até como não soube) 

o milagre das patas - tão junto ao focinho! - 

que afinal estavam justas, servindo muito bem 

para agatanhar, fugir, segurar o alimento, voltar 

atrás de repente, quando necessário 

Está pois tudo certo, ó "Deus dos cemitérios pequenos"? 

Mas quem sabe quem sabe quando há engano 

nos escritórios do inferno? Quem poderá dizer 

que não era para príncipe ou julgador de povos 

o ímpeto primeiro desta criação 

irrisória para o mundo - com mundo nela? 

Tantas preocupações às donas de casa - e aos médicos - 

ele dava! 

Como brincar ao bem e ao mal se estes nos faltam? 

Algum rapazola entendeu sua esta vida tão ímpar 

e passou nela a roda com que se amam 

olhos nos olhos - vítima e carrasco 

Não tinha amigos? Enganava os pais? 

Ia por ali fora, minúsculo corpo divertido 

e agora parado, aquoso, cheira mal. 

Sem abuso 

que final há-de dar-se a este poema? 

Romântico? Clássico? Regionalista? 

Como acabar com um corpo corajoso e humílimo 

morto em pleno exercício da sua lira?


Durante muitos anos, quis fazer um raccord com Kafka a partir deste poema. Depois deixei-me disso. Acho que simplesmente percebi que o raccord era mesmo comigo. E dizem para aí (alguns…) que a poesia não ensina nada.

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