Platão ou o porquê
Por obscuros motivos,
em circunstâncias desconhecidas,
o Ser Ideal deixou de ser suficiente a si próprio.
Mas poderia durar e durar sem fim,
talhado das trevas, forjado da claridade
nos seus jardins sonolentos sobre o mundo.
Por que diabo começou a procurar aventuras
na má companhia da matéria?
De que lhe serviram imitadores
falidos, malfadados,
sem perspectivas de eternidade?
A Sabedoria coxa
com um espírito cravado no calcanhar?
A Harmonia dilacerada pelas
águas revoltas?
A Beleza
com os seus nadas atraentes intestinos?
E o Bem —
para quê a sua sombra
se antes não a tinha?
Deve ter havido algum motivo,
por mais fútil que pareça,
mas isso não será revelado nem pela Verdade Nua,
ocupada em remexer
no vestuário terreno.
E ainda, meu Platão, todos estes poetas horríveis,
aparas varridas pelo vento de debaixo das estátuas,
resíduos do grande Silêncio nas alturas...
Wislawa Szymborska, Instante
Tradução de Elzbieta Milewska e Sérgio Neves
Relógio D'Água, 2006
[instante 1] auto-análise impessoal
Luís Mourão
29.4.06 |
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