Multiplex 6 (take 1)

David Cronenberg, História de violência

— Psiquicamente, está tudo no lugar certo.
— Concordo, Leitora.
— É preciso aprender a violência, para que ela não nos prenda quando irromper.
— Também concordo, Leitora. É isso que em parte acontece ao filho. A sua recusa inicial em responder às provocações dos colegas tem tanto de bom-senso como de recalcamento extremo dos seus instintos de defesa. Percebe-se logo que aquilo há-de explodir, ele não é uma vítima, como ninguém naquela família é uma vítima, e é isso que a faz ser a família normal do sonho americano, mais do que qualquer outra coisa.
— E é por isso que quando o rapaz explode, mostrando que afinal é bem o filho daquilo que o pai foi no seu passado, nós percebemos de uma vez por todas que o filme é sobre a necessidade de incorporar a violência na nossa normalidade: uma violência como legítima defesa e sempre proporcional à ameaça de que nos defendemos. É isso que legitima que o pai tenha morto os assaltantes do seu café, porque o que estava em causa era matá-los ou ser morto por eles; e é isso que condena a violência do filho, porque ela foi para lá daquilo que era necessário para se defender. Mas precisamente, o pai sabe como lidar com a violência, dado o seu passado, o filho não, porque foi criado em suposta não-violência.
— Não se esqueça dessa conclusão parcial, Leitora, porque é aí que o acerto psíquico do filme encontra um subtexto politico que, a mim, me deixou com um pé atrás.

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